Solenidade do Pentecostes
O Pentecostes é uma festa judaica muito antiga, celebrada 50 dias depois da Páscoa. Inicialmente era uma festa agrícola em que se agradecia a colheita do trigo e ofereciam as primícias. Posteriormente passou a celebrar a chegada do Povo de Israel ao Sinai, onde o Povo do Senhor recebeu a Lei de Deus. Lucas quer assim afirmar que na festa judaica da Lei de Moisés, recebemos a Nova Lei de Cristo: o Espírito Santo. Por isso, descreve os mesmos fenómenos ocorridos no Sinai: trovões, vento forte, chamas de fogo, várias línguas... A Igreja é a grande família do Povo de Deus, sem barreiras de língua, raça ou nação. Se Babel é sinal do desentendimento e da desarmonia; o Pentecostes gera um movimento contrário: todos falam a língua que todos compreendem; formam uma única família, onde todos se entendem e se amam.
S. Lucas, na primeira leitura, descreve-o como um facto solene, acontecido na festa judaica da Lei, da Aliança, 50 dias depois da Páscoa. O Espírito Santo transforma profundamente os apóstolos e une numa mesma comunidade de amor, povos de todas as raças, línguas e culturas.
A segunda leitura, recorda a actuação do Espírito Santo na Comunidade: o Espírito é a fonte de onde brota a vida da comunidade cristã. É Ele que concede os dons que enriquecem a comunidade e que fomenta a unidade de todos os membros; por isso, esses dons não podem ser usados para benefício pessoal, mas devem ser postos ao serviço de todos.
S. João, no Evangelho, situa a recepção do Espírito Santo ao anoitecer do dia de Páscoa: o "anoitecer", as "portas fechadas" e o "medo" revelam a situação de uma comunidade desorientada e insegura. Entretanto, Jesus aparece "no meio deles". Os discípulos redescobrem o seu ponto de referência e recuperam a sua identidade. Jesus dá-lhes "a paz". Significa serenidade, tranquilidade, confiança, para superarem o medo e a insegurança. Em seguida, Jesus "mostra-lhes as mãos e o lado". São os "sinais" da entrega total e amorosa de Jesus na cruz. Depois, comunica-lhes o Espírito Santo, com o gesto de soprar sobre os discípulos. Com o "sopro" de Deus, na criação, o homem de barro adquiriu vida; com este "sopro" de Jesus, nasce também o Homem Novo. Finalmente, Jesus envia os discípulos em missão: "Assim como o Pai Me enviou, também Eu vos envio a vós».
Leitura dos Actos dos Apóstolos
Quando chegou o dia de Pentecostes,
os Apóstolos estavam todos reunidos no mesmo lugar.
Subitamente, fez se ouvir, vindo do Céu,
um rumor semelhante a forte rajada de vento,
que encheu toda a casa onde se encontravam.
Viram então aparecer uma espécie de línguas de fogo,
que se iam dividindo,
e poisou uma sobre cada um deles.
Todos ficaram cheios do Espírito Santo
e começaram a falar outras línguas,
conforme o Espírito lhes concedia que se exprimissem.
Residiam em Jerusalém judeus piedosos,
procedentes de todas as nações que há debaixo do céu.
Ao ouvir aquele ruído, a multidão reuniu se
e ficou muito admirada,
pois cada qual os ouvia falar na sua própria língua.
Atónitos e maravilhados, diziam:
«Não são todos galileus os que estão a falar?
Então, como é que os ouve cada um de nós
falar na sua própria língua?
Partos, medos, elamitas,
habitantes da Mesopotâmia, da Judeia e da Capadócia,
do Ponto e da Ásia, da Frígia e da Panfília,
do Egipto e das regiões da Líbia, vizinha de Cirene,
colonos de Roma, tanto judeus como prosélitos,
cretenses e árabes,
ouvimo-los proclamar nas nossas línguas
as maravilhas de Deus».
Salmo Responsorial – Salmo 103 (104)
Refrão: Enviai, Senhor, o vosso Espírito
e renovai a face da terra.
Bendiz, ó minha alma, o Senhor.
Senhor, meu Deus, como sois grande!
Como são grandes, Senhor, as vossas obras!
A terra está cheia das vossas criaturas.
Se lhes tirais o alento, morrem
e voltam ao pó donde vieram.
Se mandais o vosso espírito, retomam a vida
e renovais a face da terra.
Glória a Deus para sempre!
Rejubile o Senhor nas suas obras.
Grato Lhe seja o meu canto
e eu terei alegria no Senhor.
Leitura da Primeira Epístola do apóstolo São Paulo aos Coríntios
Irmãos:
Ninguém pode dizer «Jesus é o Senhor»
a não ser pela acção do Espírito Santo.
De facto, há diversidade de dons espirituais,
mas o Senhor é o mesmo.
Há diversas operações,
mas é o mesmo Deus que opera tudo em todos.
Em cada um se manifestam os dons do Espírito
para o bem comum.
Assim como o corpo é um só e tem muitos membros
e todos os membros, apesar de numerosos,
constituem um só corpo,
assim também sucede com Cristo.
Na verdade, todos nós
- judeus e gregos, escravos e homens livres -
fomos baptizados num só Espírito,
para constituirmos um só Corpo.
E a todos nos foi dado a beber um único Espírito.
Sequência
Vinde, ó santo Espírito, vinde, Amor ardente,
acendei na terra vossa luz fulgente.
Vinde, Pai dos pobres: na dor e aflições,
vinde encher de gozo nossos corações.
Benfeitor supremo em todo o momento,
habitando em nós sois o nosso alento.
Descanso na luta e na paz encanto,
no calor sois brisa, conforto no pranto.
Luz de santidade, que no Céu ardeis,
abrasai as almas dos vossos fiéis.
Sem a vossa força e favor clemente,
nada há no homem que seja inocente.
Lavai nossas manchas, a aridez regai,
sarai os enfermos e a todos salvai.
Abrandai durezas para os caminhantes,
animai os tristes, guiai os errantes.
Vossos sete dons concedei à alma
do que em Vós confia:
Virtude na vida, amparo na morte,
no Céu alegria. Amen, Aleluia!
Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São João
Na tarde daquele dia, o primeiro da semana,
estando fechadas as portas da casa
onde os discípulos se encontravam,
com medo dos judeus,
veio Jesus, colocou Se no meio deles e disse-lhes:
«A paz esteja convosco».
Dito isto, mostrou lhes as mãos e o lado.
Os discípulos ficaram cheios de alegria ao verem o Senhor.
Jesus disse-lhes de novo:
«A paz esteja convosco.
Assim como o Pai Me enviou,
também Eu vos envio a vós».
Dito isto, soprou sobre eles e disse-lhes:
«Recebei o Espírito Santo:
àqueles a quem perdoardes os pecados ser-lhes-ão perdoados;
e àqueles a quem os retiverdes serão retidos».
Ouve, Senhor...
Precisamos do teu Espírito na Igreja:
Para ser tuas testemunhas.
Para entender as tuas palavras.
Para viver com mais força o Evangelho.
Para viver em verdade a Verdade.
Para ser espirituais e viver segundo o Espírito.
Precisamos do teu Espírito no mundo:
Para viver em paz e semear a paz.
Para ser mais samaritanos para com os outros.
Para viver na justiça e na liberdade.
Para ser mais irmãos e mais solidários.
Precisamos do teu Espírito entre nós:
Para curar o nosso coração ferido de egoísmo.
Para nos abrirmos ao sofrimento que brada ao céu.
Para chamar irmão ao que passa ao nosso lado.
Para nos deixarmos guiar pelo teu Espírito.
ORAÇÃO UNIVERSAL
Caríssimos irmãos:
Neste dia santíssimo em que terminam as festas pascais,
oremos a Deus Pai todo-poderoso,
para que o dom do Espírito Santo renove toda a Igreja,
dizendo, com alegria:
R. Mandai, Senhor, o vosso Espírito.
1. Pela Igreja, presente em toda a terra,
para que proclame as maravilhas do amor de Deus
em todas as línguas e culturas do universo, oremos.
2. Pelo Papa, sucessor de Pedro, pelos bispos,
e por todos os párocos e suas comunidades,
para que o Espírito Santo lhes dê ardor e sabedoria, oremos.
3. Por todos aqueles que invocam a Deus como Pai
e receberam em seus corações o dom do Espírito Santo,
para que sejam testemunhas vivas do Evangelho, oremos.
4. Por cada homem que faz o bem e ama a justiça,
que luta e sofre pela liberdade e pela paz,
para que o Espírito Santo torne mais firme a sua esperança, oremos.
5. Pelos fiéis que receberam dons do Espírito
e exercem ministérios na nossa comunidade (paroquial),
para que em tudo agradem ao Senhor, oremos.
6. Por todos os que sofrem as consequências da actual pandemia,
para que Deus nosso Senhor, conceda a cura aos enfermos,
Força aos que trabalham na saúde, conforto às famílias
e a salvação a todos as vítimas mortais, oremos.
Deus eterno e omnipotente,
que enviastes aos corações dos vossos fiéis
o Espírito Santo da manhã do Pentecostes,
tornai-nos testemunhas do Evangelho
e das maravilhas que realizastes pelos homens.
Por Cristo, nosso Senhor.
Alguém veio dizer-me que o Espírito Santo é em nós, o que o açúcar é no chá. Acontece algumas vezes que não achamos bom o chá. Descobrimos então a causa disso quando se chega ao fundo da chávena: era o açúcar. Havia açúcar lá, mas estava todo no fundo. Teria sido necessário mexer. Talvez o que esteja a faltar à nossa vida também tenha ficado no fundo. A nossa vida talvez não tenha o sabor esperado porque não temos a coragem de ir ao fundo das coisas. Fazemos caretas como ao tomar o chá sem açúcar. Precisamos de fazer o esforço de mexer a vida, de tocar nos segredos de Deus em nós, para que o Seu Espírito possa adoçar o todo que somos.Assim o Espírito Santo é este segredo de Deus em nós. O Espírito está aí mas é preciso mexer.
O Patriarca Atenágoras escreveu que sem o Espírito Santo, Deus fica longe; Cristo permanece no passado; o Evangelho é letra morta, a Igreja é uma simples organização; a autoridade é um poder; o culto, uma velharia. Mas, no Espírito, o cosmos é enobrecido; Cristo torna-se presente; o Evangelho faz-se vida; a Igreja realiza a comunhão...
É preciso mexer o que Deus pôs dentro de nós.
E começaram a falar outras línguas.» (Act 2, 4)
Vens, ó Espírito
Crias, recrias e inventas no suave bailado dos dias,
na aragem, no sorriso e na lágrima,
que soltam as torrentes interiores
da dor e da irmã alegria, e vens, ó Espírito,
desarrumar os nossos planos,
estes esquemas divinos à nossa medida,
cheios de aparência e tão vazios de Ti.
Despojas e despes as nossas roupagens
de brocados e atavios, discursos e fogos fátuos
que Te escondem e sufocam, e vens, ó Espírito,
maravilhar-nos com a nudez do que somos,
criados para tudo fazer com amor
e andar descalços, de mãos dadas com a verdade.
Espantas e acordas do sono e do desencanto
os que sonhámos um dia que tudo podia ser novo
mas não levámos mais além
o brilho contagiante dos olhos, e vens, ó Espírito,
reavivar das cinzas o fogo
que ateia incêndios na burocracia da vida
e nos desertos revelas nascentes.
Ergues e elevas o abatido,
caído por si ou por nós na berma do caminho
por onde passas no Teu jeito alegre
aprendido com o Filho, próximo de todos,
sempre disposto a parar, e vens, ó Espírito,
confirmar a salvação como dom do Pai,
distante de leis e policiamentos,
porque cheia de esperança e festa.
Porque vens, ó Espírito,
não cruzaremos os nossos braços
para Te abraçar todos os dias!
Pe. Vítor Gonçalves
Homilia do Papa Francisco em Dia de Pentecostes
«Chega hoje ao seu termo o tempo de Páscoa, desde a Ressurreição de Jesus até ao Pentecostes: cinquenta dias caraterizados de modo especial pela presença do Espírito Santo. De facto, o Dom pascal por excelência é Ele: o Espírito criador, que não cessa de realizar coisas novas. As Leituras de hoje mostram-nos duas novidades: na primeira, o Espírito faz dos discípulos um povo novo; no Evangelho, cria nos discípulos um coração novo.
Um povo novo. No dia de Pentecostes o Espírito desceu do céu em «línguas, à maneira de fogo, que se iam dividindo, e pousou uma sobre cada um deles. Todos foram cheios do Espírito Santo e começaram a falar outras línguas» (At 2, 3-4). Com estas palavras, é descrita a ação do Espírito: primeiro, pousa sobre cada um e, depois, põe a todos em comunicação. A cada um dá um dom e reúne a todos na unidade. Por outras palavras, o mesmo Espírito cria a diversidade e a unidade e, assim, molda um povo novo, diversificado e unido: a Igreja universal. Em primeiro lugar, com fantasia e imprevisibilidade, cria a diversidade; com efeito, em cada época, faz florescer carismas novos e variados. Depois, o mesmo Espírito realiza a unidade: liga, reúne, recompõe a harmonia. «Com a sua presença e ação, congrega na unidade espíritos que, entre si, são distintos e separados» (Cirilo de Alexandria, Comentário ao Evangelho de João, XI, 11). E desta forma temos a unidade verdadeira, a unidade segundo Deus, que não é uniformidade, mas unidade na diferença.
Para se conseguir isso, ajuda-nos o evitar duas tentações frequentes. A primeira é procurar a diversidade sem a unidade. Sucede quando se quer distinguir, quando se formam coligações e partidos, quando se obstina em posições excludentes, quando se fecha nos próprios particularismos, porventura considerando-se os melhores ou aqueles que têm sempre razão - são os chamados guardiões da verdade. Desta maneira escolhe-se a parte, não o todo, pertencer primeiro a isto ou àquilo e só depois à Igreja; tornam-se «adeptos» em vez de irmãos e irmãs no mesmo Espírito; cristãos «de direita ou de esquerda» antes de o ser de Jesus; inflexíveis guardiães do passado ou vanguardistas do futuro em vez de filhos humildes e agradecidos da Igreja. Assim, temos a diversidade sem a unidade. Por sua vez, a tentação oposta é procurar a unidade sem a diversidade. Mas, deste modo, a unidade torna-se uniformidade, obrigação de fazer tudo juntos e tudo igual, de pensar todos sempre do mesmo modo. Assim, a unidade acaba por ser homologação, e já não há liberdade. Ora, como diz São Paulo, «onde está o Espírito do Senhor, aí está a liberdade» (2 Cor 3, 17).
Então a nossa oração ao Espírito Santo é pedir a graça de acolhermos a sua unidade, um olhar que, independentemente das preferências pessoais, abraça e ama a sua Igreja, a nossa Igreja; pedir a graça de nos preocuparmos com a unidade entre todos, de anular as murmurações que semeiam cizânia e as invejas que envenenam, porque ser homens e mulheres de Igreja significa ser homens e mulheres de comunhão; é pedir também um coração que sinta a Igreja como nossa Mãe e nossa casa: a casa acolhedora e aberta, onde se partilha a alegria multiforme do Espírito Santo.
E passemos agora à segunda novidade: um coração novo. Quando Jesus ressuscitado aparece pela primeira vez aos seus, diz-lhes: «Recebei o Espírito Santo. Àqueles a quem perdoardes os pecados, ficarão perdoados» (Jo 20, 22-23). Jesus não condenou os seus, que O abandonaram e renegaram durante a Paixão, mas dá-lhes o Espírito do perdão. O Espírito é o primeiro dom do Ressuscitado, tendo sido dado, antes de mais nada, para perdoar os pecados. Eis o início da Igreja, eis a cola que nos mantém unidos, o cimento que une os tijolos da casa: o perdão. Com efeito, o perdão é o dom elevado à potência infinita, é o amor maior, aquele que mantém unido não obstante tudo, que impede de soçobrar, que reforça e solidifica. O perdão liberta o coração e permite recomeçar: o perdão dá esperança; sem perdão, não se edifica a Igreja.
O Espírito do perdão, que tudo resolve na concórdia, impele-nos a recusar outros caminhos: os caminhos apressados de quem julga, os caminhos sem saída de quem fecha todas as portas, os caminhos de sentido único de quem critica os outros. Ao contrário, o Espírito exorta-nos a percorrer o caminho com duplo sentido do perdão recebido e do perdão dado, da misericórdia divina que se faz amor ao próximo, da caridade como «único critério segundo o qual tudo deve ser feito ou deixado de fazer, alterado ou não» (Isaac da Estrela, Discurso 31). Peçamos a graça de tornar o rosto da nossa Mãe Igreja cada vez mais belo, renovando-nos com o perdão e corrigindo-nos a nós mesmos: só então poderemos corrigir os outros na caridade.
Peçamos ao Espírito Santo, fogo de amor que arde na Igreja e dentro de nós, embora muitas vezes o cubramos com a cinza das nossas culpas: «Espírito de Deus, Senhor que estais no meu coração e no coração da Igreja, Vós que fazeis avançar a Igreja, moldando-a na diversidade, vinde! Precisamos de Vós, como de água, para viver: continuai a descer sobre nós e ensinai-nos a unidade, renovai os nossos corações e ensinai-nos a amar como Vós nos amais, a perdoar como Vós nos perdoais. Amen».
Papa Francisco,
Roma, 4 de Junho de 2017