Uma feliz quarentena!
Quaresma e quarentena são palavras quase sinónimas, porque ambas significam um período de quarenta dias. Mas enquanto a Quaresma tem uma particular conotação religiosa, porque remete para o tempo que vai da quarta-feira de cinzas até ao tríduo pascal, a quarentena aplica-se sobretudo aos passageiros que, encontrando-se infectados, ficam durante quarenta dias impedidos de desembarcar, para evitar a propagação da sua doença.
A abstinência da carne é prescrita, a partir dos 14 anos, a todos os cristãos que se encontrem bem de saúde. Esta exigência deve ser especialmente observada durante a Quaresma, mas a abstinência é obrigatória todas as sextas-feiras do ano, com excepção de aquelas que coincidam com alguma solenidade, como o Natal. A razão de ser desta obrigação penitencial, que não se limita ao tempo quaresmal, decorre do facto de, tendo Jesus morrido num tal dia da semana, todas as sextas-feiras são, desde então, dias penitenciais.
Inicialmente, a abstinência cumpria-se pela privação da carne, mas basta que, nesse dia, se coma uma refeição mais simples e pobre, mesmo que não seja carne, até porque um peixe especialmente requintado, ou caro, poderia servir a letra da lei penitencial, mas contradizendo o seu espírito. A Conferência Episcopal Portuguesa também permite que se cumpra este preceito oferecendo algum sacrifício, participando na Missa, fazendo uma leitura da Sagrada Escritura, ou rezando o terço de Nossa Senhora. Também se pode substituir a abstinência pelo contributo penitencial, cujo destino é decidido cada ano pelo Bispo diocesano.
Se a abstinência é obrigatória umas 52 vezes por ano, tantas quantas as sextas-feiras, o jejum só é obrigatório, para os fiéis com mais de 18 anos e menos de 60, duas vezes ao ano: na quarta-feira de cinzas e na sexta-feira santa.
Se a abstinência tem mais que ver com a qualidade da comida, o jejum refere-se à quantidade. Geralmente, cumpre-se omitindo uma das principais refeições do dia, ou seja, o almoço ou o jantar. No entanto, pode-se tomar um alimento ligeiro; também se pode reduzir para metade essas duas refeições, sem necessidade de suprimir radicalmente nenhuma delas. Mas, se o fizer, não vou passar fome? Sim, talvez, mas é isso mesmo que se pretende, porque esse sacrifício, que não prejudica a saúde, fortalece a vontade, sobretudo na luta contra a tentações.
Aproveitemos esta Quaresma para pôr de quarentena os nosso vícios e principais defeitos, não apenas pelo jejum e abstinência prescritos pela Igreja, mas também pela prática da caridade, sem a qual nenhum sacrifício é válido aos olhos de Deus. Uma pequena mortificação, feita por amor a Deus e ao próximo, não só fortalece a nossa alma na prática da virtude, como também dá glória a Deus e, pela comunhão dos santos, beneficia toda a Igreja. Que a presença de Nossa Senhora, junto à Cruz de Jesus, nos anime a viver com generosidade este tempo de quaresma, para depois podermos participar na alegria da ressurreição de Nosso Senhor.
Pe. Gonçalo Portocarrero de Almada