Os netos são a melhor terapia para o envelhecimento
Podemos fazer muitos filmes sobre como é que vamos reagir quando virmos pela primeira vez um neto, mas a realidade supera em muito a ficção.
Acreditem. O coração acelera ao ponto de nos deixar sem ar – é um sentimento que já conhecemos de cor, amamos os filhos como amamos os netos, é uma entrega que não tem nada que saber, com a vantagem de que desta vez não estamos a recuperar de um parto. E o passo seguinte parece subitamente tão óbvio: é só pegar neles e levá-los para casa. São nossos!
Depois, vem o balde de água fria, à medida que vamos tendo consciência de que, agora, o nosso papel é o de retaguarda, o de naqueles primeiros tempos sermos, antes de mais e acima de tudo, cuidadores dos pais desta criança, para que possam ser os melhores pais possíveis. Que o que se espera de nós é que estejamos disponíveis para quando somos necessários, sem, no entanto, nos intrometermos (demais). E ui, custa tanto.
Custa não puxar pelos galões e dizer “Já te criei a ti, por isso sei melhor”. Às vezes, custa não competir com filhas e noras, custa não decidir como deve ser “educado”, custa ouvir (ou subentender) que os nossos conhecimentos aparentemente já passaram de moda, ultrapassados por uma qualquer aplicação tecnológica.
Mas quando sabemos respeitar, apoiar sem cobrar e – sim, é mesmo difícil – não mandar bocas nem palpites a toda a hora, confiando , eles vão retribuir a confiança, convidando-nos a fazer cada vez mais parte da vida dos seus filhos. E, cereja em cima do bolo, permitindo que fiquem sozinhos connosco, para criarmos diretamente memórias e laços indestrutíveis (e é verdade que se portam muito melhor connosco do que com os paizinhos, mas lamento informar que isso acontece não porque somos mais perfeitos, mas porque o nosso amor não lhes é tão vital como o dos seus pais, não merecendo tanta luta!).
A boa notícia é que, no meio de tudo isto, os netos são o melhor antídoto para o envelhecimento, o melhor creme antirrugas, acreditem. Voltamos a trepar às árvores, a entrar na água gelada do mar, a fazer guerras de almofadas, a ver o mundo através dos seus olhos – e que espantoso nos parece, como se o observássemos pela primeira vez.
São estes os laços que vão ficar, esta intimidade preciosa que não se perde, mesmo que haja momentos em que pareça mais intensa e noutras mais ténue. É este o nosso verdadeiro investimento para a reforma, não no sentido oportunista do termo, como se esperássemos receber o que demos, com juros de preferência, mas na medida em que este amor nos carregará sempre as pilhas. Vamos ficar mais velhos, mais chatos e, muito provavelmente, ainda mais esquecidos e trôpegos, mas acredito que quando olharem para nós continuarão a ver os avós que sempre os amaram tão incondicionalmente.
E depois há o Frasco das Memórias. Exatamente, um frasco onde se vão guardando cartões em que avós e netos escrevem (ou desenham) as coisas boas que fazem juntos. Eu tenho um destes frascos ao lado da banheira, e todos os dias Aro de lá um cartão e leio “O circo na Praia de Mira”, “O cheiro da almofada da avó” ou “O dia em que nos deu uma mangueirada com os sapatos postos” e, zás!, é como se lá estivesse de novo. A sentir o que senti, numa regressão de felicidade.
Não parem nunca de acumular cartões, mesmo quando já são adolescentes e resmungam, e façam um segundo ou um terceiro, e tantos quantos forem necessários para guardar todos esses momentos, porque só as relações cultivadas e constantemente adubadas resistem ao tempo.
Mas espere, não se torne num desses avós que só vive para os netos, que só investe emocionalmente neles. Não cometa esse erro. Invista em si, na sua vida de casal, nos seus passatempos, Are um curso de computadores, continue a aprender, a ter amigos, a passear, a fazer exercício. Recicle-se, mantenha-se uma pessoa interessante e interessada, e não espere que sejam os outros a fazer esse trabalho por si.
Para isso, vai ter de aprender a dizer “Não, não posso” quando os seus filhos lhe ligarem a pedir para ficar com as crianças num dia em que já tem um compromisso, ou simplesmente uma série de televisão para acabar. Não é nada fácil, sentimos sempre que é egoísmo, porque temos uma eterna culpa original em relação aos nossos filhos, mas force-se a fazê-lo, oferecendo uma data alternativa, aguentando um primeiro amuo que depois passa. E passará ainda mais rapidamente se lhes explicar que quanto mais tiver vida própria, menos lhes vai pesar no futuro.
Um último conselho: não ceda à amargura, mantenha a capacidade de se rir de si próprio e faça como o Papa Francisco, reze todos os dias para que Deus lhe dê um sentido de humor apurado. Os contratempos tornam-se infinitamente mais fáceis de suportar. O riso torna a vida de todos mais fácil nesta Terra e abre-nos seguramente a porta da Eternidade.
Feliz Dia dos Avós e dos Idosos.
Isabel Stilwell
Sintra, Julho 2024
Departamento Nacional da Pastoral Familiar
Dia Mundial dos Avós e dos Idosos, 28-07-2024